quinta-feira, 4 de setembro de 2014



         Morre-me nos lábios a água

Morre-me nos lábios a água de tanta sede oculta.
Por ela sei do rio que desperta no sangue
a cintura do fogo
e acorda nas virilhas
o indizível êxtase da luz.

Uma ânfora apenas guarda o fluir das mãos
mergulhadas no cio de todas as palavras,
e sortilégios outros que ao barro confiaram
os seculares desígnios de tão intenso lume. 

São rios clandestinos os lábios desta sede
de imaculadas águas.
Com eles ousarei, secretamente,
a transgressão das margens;
direi que me pertencem os pequenos delitos
de quantos marinheiros intentaram na areia
um cais onde aportar os abismos do corpo,
e gritarei  teu nome em cada gota ausente,
mordendo na garganta palavras interditas.


Fernando Fitas – Inédito 2014
(Exercício sobre um guache de Francisco Simões

concebido em 1992 para capa de outro livro do autor) 

Sem comentários:

Enviar um comentário